Mercado avalia positivamente o texto da nova âncora para os gastos públicos, mas acredita que governo não conseguirá zerar o déficit
A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (22), o novo marco fiscal, que substitui o teto de gastos como principal âncora para controlar as contas públicas.
Agora, os holofotes se viram para as propostas do Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2024, desafiando o governo a cumprir a meta fiscal de zerar o déficit federal.
O mercado avaliou positivamente o texto da nova regra fiscal, porém analistas afirmam que o Executivo não conseguirá deixar o déficit zerado.
No caminho, dizem os especialistas, ainda há grandes obstáculos que precisam ser ultrapassados.
Conforme o economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung, a retirada do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) da nova regra é um desses entraves.
“Para poder cumprir a meta de zerar o déficit, o governo terá que elevar a arrecadação, sendo que isso ainda tem um longo caminho pela frente com discussões com o Congresso. Não deverá ser algo tão fácil”, diz.
Apesar de o novo marco ser um importante sinal para as contas públicas, trazendo maior previsibilidade sobre o risco fiscal, a sua execução, na visão de Sung, é o grande desafio.
“A trajetória da dívida pública, em nosso cenário base, deve continuar crescendo, mas a ritmos menores, comparado como se não tivesse o arcabouço.”
A projeção do economista é de que o país tenha um déficit primário de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, e de 0,8% em 2024.
Na visão de Gabriel de Barros, economista-chefe da Ryo Asset e ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), o governo não vai conseguir cumprir a meta, considerada ambiciosa e desafiadora.
“Ainda que o governo esteja tentando ir na direção correta, tudo indica que o tamanho da frustração vai ser grande, com déficit de 0,8% do PIB em 2024, número bem acima de zero.”
Gabriel de Barros
Segundo o especialista, o governo ainda irá revisar a meta, mas, por ora, deve continua na aposta que se comprometeu.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem que encaminhar o Orçamento de 2024 até 31 de agosto. Barros acredita na entrega no prazo, mas sem grandes mudanças nas perspectivas.
“Provavelmente essa proposta será revisada só no final do ano ou no começo de 2024?, explica.
“A equipe econômica sabe disso e está tentando usar o tempo a seu favor para evitar uma revisão da meta logo no primeiro ano do governo. Isso afetaria a credibilidade da nova regra fiscal”.
Cenário para 2024
O governo tem vários aumentos de despesas contratados para 2024, como o reajuste do funcionalismo público e novos concursos, pontua o especialista.
Além disso, os gastos com Previdência, Bolsa Família e abono salarial também já estão no horizonte.
“O governo decidiu que o salário mínimo vai ter um crescimento real até 2026. Isso impõe um crescimento automático de todas as despesas com essa remuneração como referência, como o abono salarial e a Previdência Social”.
Dificuldade na receita
A receita de 2024 vem, majoritariamente, das medidas que o governo está anunciando, diz Barros.
Ele emenda que há suspeita de que esses planos serão frustrados, ou seja, a arrecadação que o governo está prevendo não vai se materializar integralmente na magnitude esperada.
Um dos pontos de decepção, segundo o especialista, será com a receita extraordinária. Nesta seara estão decisões judiciais e mudanças de tributação desenhadas pela equipe econômica.
Outra questão envolve as receitas recorrentes, que como o nome diz, são fixas e caminham com o PIB.
“A previsão é arrecadar 2,3% do PIB em 2024, sendo que o consenso de mercado é de 1,3%”, aponta o especialista.
“Se a projeção do mercado se materializar, teremos basicamente de R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões de receita a menos em 2024.”Gabriel de Barros
Na opinião de Barros, dadas as restrições para ampliar carga tributária, o ideal para o plano de consolidação fiscal é trabalhar medidas pelo lado dos gastos, onde há mais espaço para manobras.
“A ineficiência da despesa é tão grande que não há razão econômica para não implementar ajustes e medidas que corrijam o mau desenho de políticas públicas e improdutividade do gasto”, ressalta,
“É possível fazer um ajuste focando também na despesa, e esse deveria ser o caminho”, conclui.
Fonte: CNN