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quarta-feira, 1 maio, 2024

A tragédia da ganância

Boate Kiss, em Santa Maria/RS: seguranças impediram saída das vítimas

Todos, perplexos, estamos assistindo desde a manhã desse domingo as notícias a respeito do incêndio que matou, pelo menos, 233 pessoas em uma boate em Santa Maria, Rio Grande do Sul. Foi o maior número de mortos em incêndios na história do Brasil desde que o Gran Circo Americano pegou fogo em Niterói/RJ, em 1961, vitimando 503 pessoas. Até o incêndio do Edifício Joelma em São Paulo, em 1974, matou menos (188). Em termos de tragédia, o caso da boate supera também os dois maiores desastres aéreos brasileiros – a queda de um avião da Tam, em Congonhas, em 2007 (188 mortos) e o choque do vôo 1907 da Gol em Mato Grosso (154 mortos). Perde apenas para o número de mortos nas enchentes e deslizamentos, dois anos atrás, na região serrana do Rio (900 pessoas).

Se analisarmos a fundo quase todos esses casos ocorreram por falhas humanas. Em alguns por erros técnicos, intransigência, inexperiência ou ordens mal dadas. Mas nenhuma dessas falhas, em termo morais, supera a do incêndio em Santa Maria: 233 famílias perderam entes queridos por causa da GANÂNCIA – na hora em que a boate começou a pegar fogo, elas foram impedidas pelos seguranças de sair do local porque não tinham pago a conta. Ou seja: essas pessoas morreram, talvez porque tivessem consumido um refrigerante, um copo de cerveja ou de uísque. Morreram por causa de poucas dezenas de reais que teriam de pagar. Morreram por causa da ganância do proprietário que teria ordenado aos seguranças para impedir a saída em massa dos frequentadores. Assim ele cotou a vida de cada um dos mortos em, no máximo, uns 50 reais!

A boate também não deveria estar funcionando – estava com o alvará vencido. Provavelmente, como se tratava de uma pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul, algum fiscal, vereador, secretário ou até mesmo o próprio prefeito, podem ter feito vista-grossa a respeito dessa irregularidade. Talvez até tenham recebido uma pequena contribuição do proprietário para isso. Quem sabe? Ninguém sabe, mas não se duvida. É um caso típico de situação que ocorre em qualquer cidade do país e não se dá a mínima importância. Até que ocorram tragédias como essa.

O proprietário da Boate Kiss, como chamava a casa noturna, deve ser punido como um assassino em massa. Na minha opinião não se difere de um maluco que entra atirando numa escola. Ele fez muito pior – sabendo das consequência, barrou estas vítimas, impediu-as de sair correndo porque não tinham pago a conta. Agora tomara que ele pague essa conta. Ele e os seguranças que seguiram suas lamentáveis ordens.

Fico pensando até quando vamos ver tragédias acontecendo por causa da ganância ou da negligência das pessoas. E não falo só de tragédias pontuais como essa de Santa Maria, mas também da tragédia que vemos diariamente nas ruas com o consumo de drogas, os assaltos, os homicídios e todo o tipo de crime que não sofre uma ação efetiva e eficiente das autoridades. Pensa-se em remunerar as famílias dos detentos no que já ficou conhecido como “Bolsa-Cadeia” mas não investem um centavo na reestruturação das polícias. Parlamentares aprovam a troca de seus veículos funcionais, alguns com pouquíssimos quilômetros rodados, gastando milhões, mas são incapazes de aprovar um plano de contenção de deslizamento de terras e enchentes. Se eu for enumerar outras lamentáveis atitudes das nossas autoridades, de gente que deveria cuidar melhor desse país, vou levar o resto da vida.

Que Deus dê paz às famílias das vítimas de mais essa tragédia brasileira. Uma tragédia cujas atitudes que a provocaram são piores que suas consequências.

Ogg Ibrahim
Ogg Ibrahimhttp://oggibrahim.com.br
Jornalista com 34 anos de profissão, ex-repórter nacional da Rede Record, Mestre de Cerimônias, radialista e Palestrante, Produtor de vídeos e CEO na Talk Soluções em Comunicação.

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